'Já estamos na segunda onda', afirma pesquisador da USP sobre novo coronavírus
O pesquisador teme que não tenham sido tomadas as devidas precauções durante as eleições.
Já são quase seis milhões de registros oficiais de infectados pelo novo coronavírus desde março, quando a pandemia foi decretada no Brasil. Mais de 167,4 mil famílias já choraram a perda de familiares e de amigos queridos diante de um vírus silencioso e desconhecido. Mas com o retorno das atividades e do turismo no Brasil e em diversas partes do mundo, o número de casos também voltou a subir. E esse fenômeno de ter casos de uma epidemia caindo para em seguida subirem novamente é conhecido como “segunda onda”.
Em entrevista exclusiva ao portal Brasil61.com, o pesquisador e responsável pelo Laboratório de Inteligência em Saúde da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto, Domingos Alves, acredita que o Brasil já está passando por esse fenômeno.
“Se eu for levar efetivamente o nosso cenário a sério, nós nunca saímos da primeira onda. Tivemos uma declinação de casos e de óbitos que vinham sendo observados. E se eu levar em consideração as definições científicas, eu não deveria dizer que estamos na segunda onda. A minha afirmação é de que estamos na segunda onda, pois estamos com o número de casos cada vez menor devido a diminuição dos testes de uma maneira sustentada no final de agosto”, alerta.
E continua. “Em um cenário de subnotificação constante e de queda de exames, não era de se esperar que houvesse esse aumento no número de casos e de internações. E esse número é consequência do aumento de casos. Não vimos esse aumento no número de casos antes do aumento de internações porque a gente estava diminuindo a quantidade de testes. A situação que vivemos agora, e eu continuo afirmando a despeito de haver discrepância das definições, que nós já estamos na segunda onda.”
Para chegar a essa conclusão, Domingos tem observado no Brasil, nos EUA e na Europa uma nova onda de contágios, que se baseia na evolução da taxa de reprodução, que o pesquisador chama de Rt – e isso pode indicar que a pandemia voltou a crescer por aqui.
“O ‘Rt’ é uma medida que diz como que está se dando a taxa de infecção em um determinado local. Se o Rt está acima de 1, significa que uma pessoa está infectando uma ou mais pessoas naquele lugar. Se está abaixo de 1, essa taxa de infecção está sob controle. Quando olhamos essa taxa de infecção nos municípios, podemos fazer uma média móvel dos últimos 14 dias. Hoje, eu observo que temos 16 estados que há 14 dias estão com essa taxa de infecção acima de 1, ou seja, tem uma permanência. É de se esperar que nesses estados e municípios, nesses 14 dias e daqui para frente, aumente o número de infectados”, esclarece.
Para o professor e pesquisador, a postura negacionista de alguns líderes e presidentes pode ter contribuído para a atual situação. “Essa atribuição não é leviana, ela já é um consenso internacional. A maneira dessas lideranças de encarar a epidemia trouxe muitas das consequências observadas no Brasil. Boa parte do que se observou em termos de óbitos aqui teve muita participação desse negacionismo, dessa politização da doença, inclusive nos embates entre os governos estaduais e o federal”, lembra.
Sobre as eleições, o pesquisador adianta que ainda não é possível saber se haverá ou não aumento no número de casos após aglomerações durante as campanhas e pelo último domingo, quando milhões de pessoas foram às urnas.
“Ainda não é possível aferir se essas medidas tomadas durantes as eleições foram suficientes e se isso pode causar uma retomada no número de casos. O que é importante frisar é que, entre os períodos de eleição, está havendo um apagão de dados e de informações, movido pela própria eleição. Prefeitos que estão disputando as eleições não querem mostrar para a população que o vírus está circulando no município dele. Pelo contrário, querem mostrar que tiveram uma ação efetiva, positiva, coisa que não aconteceu nos municípios brasileiros de uma maneira geral”, dispara.
Fonte: Brasil 61
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