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GERAL • 18/10/2024 às 23:35

Cândido-Motense é resgatado no Alasca após viagem inspirada em história famosa

Gabriel decidiu passar a pandemia do coronavírus em um acampamento selvagem.

Cândido-Motense é resgatado no Alasca após viagem inspirada em história famosa

“A felicidade só é real quando compartilhada”. E no caso do brasileiro Gabriel Dias da Silva, 26, o mundo inteiro ficou sabendo. Desde que saiu de carona de Cuiabá em direção ao Alasca, em agosto de 2017, esse paulista nascido em Cândido Mota-SP já cruzou 22 países, mas não esperava ver sua história estampada em jornais internacionais e do Brasil, em abril desse ano. 

Inspirado no californiano Christopher McCandless, cujo fim trágico é retratado em livro e no road movie “Na Natureza Selvagem”, Gabriel decidiu passar a quarentena do coronavírus em um acampamento selvagem nos arredores do Parque Nacional Denali, no Alasca, onde fica o famoso ônibus verde em que McCandless morreu de inanição, em 1992.

Mas no melhor estilo “a vida imita (em partes) a arte”, Gabriel teve que ser resgatado de helicóptero, no último dia 14 de abril, próximo ao mesmo Magic Bus onde Alexander Supertramp passou seus últimos dias de vida.

“Eu li o livro [de Jon Krakauer] olhando para a cama em que ele [Christopher McCandless] morreu. Quando terminei, me deu um desespero. Comecei a chorar”, conta Gabriel em entrevista para o Nossa via Skype.

Perrengue cinematográfico

Do povoado de Healy, a cerca de 45 quilômetros dali, Gabriel levou quatro dias para chegar ao local, devido a uma nevasca que o obrigou a acampar por dois dias no meio da travessia. Desde o lançamento do filme de 2007, com Emile Hirsch no papel principal, o Magic Bus virou uma espécie de meca de aventureiros no Alasca. No tempo em que esteve no local, o brasileiro viu uma família inteira chegar em motos de neve, cujo cachorro aparece na foto com o brasileiro, e até um grupo de amigos que pousou em um helicóptero.

“Muita gente aproveita o inverno para visitar o ônibus porque os rios estão congelados”, explicou.

Gabriel, que chegou a perder a noção do tempo durante o acampamento selvagem no ônibus, acredita ter ficado no local por cerca de duas semanas. Equipado com um fogareiro, se alimentava de aveia, bolachas e produtos em lata como feijão e sardinha. A água que consumia vinha de um rio descongelado, a cerca de 200 metros dali.

“Era bem frio, mas eu tomava banho quase todo dia”, faz questão de avisar.

A angústia começou a bater mesmo quando se deu conta de que, além das pegadas de urso próximo ao ônibus, os rios congelados da região poderiam derreter e impedir seu retorno.

Diante do caudaloso e profundo rio Teklanika, cuja ponte de gelo que encontrara na ida tinha desaparecido, Gabriel se deparou com uma barreira natural congelada que deveria ser escalada.

Hora de pedir ajuda

Sua história só não terminou em tragédia porque, junto com o GPS que havia comprado, Gabriel adquiriu um seguro que incluía resgate em áreas remotas e podia ser acionado por um dispositivo via satélite. “Eu pretendia ficar três meses isolado até o fim da pandemia e precisava de algo para comunicação, na hora de voltar”.

Enquanto a central de atendimento conversava com sua família no Brasil, a equipe de resgate negociava com ele: esperar melhores condições de travessia do rio ou enviar um helicóptero.

O resgate aéreo chegaria 40 minutos depois do início da negociação. Seu nome, em poucas horas, ganhava o mundo.

Gabriel, que está no Alasca desde fevereiro, vê semelhanças com a história de Supertramp, que também viajava de carona e com pouco dinheiro.

“Estava tudo dentro do planejamento e tinha comida para mais alguns dias. Voltei antes porque deu vontade de voltar. Eu só não estava preparado para encontrar o rio descongelado”, lembra.

‘Zé Mané’ viajadão

Conhecido nas redes como “Gabriel Viajou” (@gabrielviajou), o paulista morava em Cuiabá, no Mato Grosso, onde atuava como corretor de imóveis, mas sentia que seu melhor endereço seria o mundo.

“Eu não aguentava mais esse sentimento insaciável de querer viajar. Já tive muita obsessão pelo dinheiro”, confessa Gabriel.

Ao ir para São Paulo de carona para acertar os detalhes da emissão do visto para os Estados Unidos, decidiu seguir até a Patagônia argentina com o apoio dos motoristas que ia encontrando no caminho.

No extremo sul do continente só conseguiu ficar dois dias, “era uma ansiedade de querer ver tudo ao mesmo tempo. Eu nem sabia que o Ushuaia era o fim do mundo”.

Gabriel costuma brincar que sofre de “mapamundite”, a vontade incontrolável de rodar o mundo quando vê um mapa.

“Eu sempre me perguntava ‘como é o mundo aí fora’. Mas por foto ou na televisão não é suficiente. Tem que ver com os próprios olhos”.

Apesar da façanha de ter cruzado alguns milhares de quilômetros (‘eu tenho que somar tudo aqui’), ele se define como um “Zé Mané”.

“Eu não me sinto mais especial do que ninguém por sonhar grande”.

Mas grande mesmo foi o susto do resgate aéreo no Alasca, um assunto que, frequentemente, Gabriel volta a mencionar, durante a longa entrevista por telefone para a reportagem do Nossa.

Vergonha

Com a repercussão internacional, Gabriel chegou a postar um vídeo em uma rede social, três dias depois do resgate. “Eu tô com muita vergonha. Depois que começou essa onda de coronavírus, eu tive a ideia, meio que idiota, de caminhar nas montanhas e passar a quarentena lá no ônibus”.

“Eu fiquei muito envergonhado de ter solicitado esse resgate e sinto muito pelo transtorno que causei para todo mundo”, completou.

Apesar da vergonha que faz questão de reforçar ao longo de seus depoimentos, Gabriel cita a Bíblia para descrever o aprendizado com tudo isso. “Mais vale um cão vivo do que um leão morto”, em referência ao versículo de Salomão, no livro Eclesiastes.

E como ele parece mais vivo do que nunca, seu plano era seguir caminhando até o Polo Norte e visitar comunidades inuítes, mas ainda não sabe como a sua viagem deve continuar por conta da pandemia.

Atualmente, Gabriel está em Willow e deve permanecer na região até agosto, quando vence seu visto. Enquanto tudo isso não passa, segue em aventuras mais inocentes como a trilha que acabou de fazer com um amigo local em minas de ouro de Coldfoot, uma comunidade mineira com apenas dez habitantes, ao norte do Círculo Polar Ártico.

 

 

Fonte site Uol, por Eduardo Vessoni




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